quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Pensando no futuro, pais investem na educação bilíngue dos filhos

 
Mãe brasileira, pai norueguês e professores ingleses. Foi em meio a essa realidade que Cláudia Storvik criou a filha, hoje com 13 anos. "Sempre soube que ela iria crescer escutando três línguas diferentes: português, norueguês e inglês", conta a advogada moradora de Londres, na Inglaterra. Cláudia sempre lidou de forma natural com situação peculiar da família, mas comenta que muitos pais que vivem em condições semelhantes não encaram de forma tranquila. "Eles têm medo que a criança não fale, que comece a falar muito tarde ou que fique confusa com mais de uma língua", diz.
Porém, o que é motivo de receio para muitos pais no exterior têm se tornado uma opção atrativa para aqueles que permanecem no Brasil. O ensino bilíngue ou multilíngue - que é caracterizado quando uma criança é alfabetizada em duas ou mais línguas, respectivamente - não é mais realidade somente para crianças que vivem em outro país. "Com a globalização, a internet e o crescimento da necessidade do uso do inglês no trabalho e na comunicação, os responsáveis têm demandado melhores resultados linguísticos de seus filhos", afirma Vanessa Tenório, sócia do Systemic Bilingual de Ensino, empresa especializada em implementar educação bilíngue em escolas.
Vanessa enxergou o potencial do ensino bilíngue no país em 1998, quando fundou a empresa com a irmã Fátima. Utilizando um método que aplica o inglês de cinco a dez horas semanais para trabalhar matérias escolares como matemática, ciências, história, geografia, artes e outras, a mestre em Educação começou a implementar o modelo em escolas particulares de São Paulo. Em 2010, o programa foi inserido em quatro escolas privadas, duas em São Paulo, uma no Rio Grande do Norte e a última em Minas Gerais. Neste ano, o número aumentou para 40 colégios privados em 12 Estados no Brasil.
Por não possuir legislação específica e nem dados oficiais, o número de escolas bilíngues no Brasil ainda é incerto. Contudo, Lyle Gordon French, ex-diretor pedagógico da Escola Cidade Jardim/PlayPen (SP) fez um mapeamento dessas instituições de ensino durante os anos de 2007 e 2009, e concluiu que o número de escolas bilíngues cresceu 24% em apenas dois anos. De acordo com a apuração, eram 149 colégios no ano de 2007 e 180 em 2009.
"A questão é que a velha fórmula do inglês oferecido no colégio, que é somente o estudo da estrutura da língua, nunca levou a resultados palpáveis em termos do uso efetivo da língua para a comunicação fluente", explica Vanessa. Para ela, o que os pais buscam é uma fluência dos pequenos, principalmente na língua inglesa. "O ensino bilíngue consegue isso, uma vez que trata a língua estrangeira como um meio de comunicação efetiva dentro de um contexto, seja em uma aula de culinária, matemática ou história".
A paulista Lilian da Silva Santos colocou a filha Marina em uma escola bilíngue já no primeiro ano de idade. Hoje, com 7 anos, a menina já consegue se comunicar de forma fluente em inglês e em português. "Eu e meu marido sofremos para aprender um pouco de inglês nos velhos cursinhos de idiomas. Gostaríamos que nossa filha aprendesse de maneira mais tranquila a língua, pois o inglês é essencial na vida acadêmica e profissional", conta a terapeuta ocupacional.

Aprender outro idioma antes dos 6 anos facilita fluência

No pátio do Colégio Friburgo, em São Paulo, uma turma da segunda série é separada em grupos de quatro. Em seguida, a professora entrega uma cartolina para cada grupo com caixas de tinta e canetinhas coloridas. Os alunos são instruídos a pintar os círculos desenhados conforme a cor descrita. A atividade seria algo ordinário não fosse o idioma falado fluentemente pela professora e os pequenos alunos: o inglês.
O exemplo da aula bilíngue da escola Friburgo comprova um fato explicado por Ricardo Schütz, pesquisador do ensino de inglês e criador do site English Made in Brazil: as crianças se adaptam ao idioma para conseguir se comunicar. Criando a filha em Londres e falando com ela em português em casa, Cláudia Storvik confirma a tese. "Desde o nascimento de nossa filha, eu falava português com ela, e meu marido, que é norueguês, falava a sua língua materna. Usávamos o famoso sistema ¿one parent, one language¿ (um pai, uma língua)", conta explicando que somente tomavam o cuidado de sempre falar com a filha no mesmo idioma: a mãe em português e o pai em norueguês. "Assim ela sabia que, para se comunicar comigo, precisava falar em português, com o pai, em norueguês, e na escola, em inglês", conta.
Cláudia afirma que a filha começou a falar com 10 meses de vida. "No começo, ela misturava as palavras, mas isso é normal e não é sinal de confusão. No início, a criança pode usar palavras das várias línguas indiscriminadamente, como minha filha fazia, porque seu principal objetivo é se comunicar. Mas uma vez que seu vocabulário cresce, o uso de cada língua passa a ser sistemático", explica.
No site English Made in Brazil, que publica artigos e estudos científicos sobre o aprendizado de idiomas, Schütz descreve que o estudo antes dos 6 anos de idade é o que torna a criança fluente em um idioma. Ele afirma que os dois hemisférios cerebrais desempenham diferentes funções - o lado esquerdo é lógico e analítico, enquanto o direito é criativo e especializado em percepção e construção de conhecimento. O hemisfério direito seria, por assim dizer, a porta de entrada das experiências e a área de processamento para transformá-las em conhecimento.
O pesquisador explica que, no cérebro de uma criança, os dois hemisférios estão mais interligados do que no cérebro de um adulto, o que significa que este é o melhor período da vida para se aprender qualquer coisa, incluindo idiomas. Com isso, a assimilação da língua ocorreria via hemisfério direito para ser sedimentada no hemisfério esquerdo como habilidade permanente, a tão desejada fluência. Ainda de acordo com ele, a maior separação dos dois hemisférios ocorre a partir da puberdade, por volta dos 12 anos de idade, ou seja, depois disso, se torna cada vez mais difícil tornar-se fluente em outras línguas. O auge da comunicação entre as duas partes do cérebro ocorre do primeiro ao sexto ano de vida, daí a facilidade das crianças em aprender novos idiomas.

Escolas bilíngues são mais caras

Porém, os pais que querem propiciar uma alfabetização para os filhos em dois idiomas precisam se preparar para os custos elevados. Segundo Vanessa Tenório, esses colégios geralmente são mais caros porque a carga horária é superior e porque demandam a contratação de profissionais mais especializados.
Segundo a especialista, essas escolas costumam ter mais horas de aula por dia, mas na educação infantil é comum lecionar uma aula do currículo padrão no segundo idioma, sem acrescentar mais tempo no colégio. "O conceito é usar a língua como meio de comunicação, e não como fim", diz ela, explicando que o ensino bilíngue não compreende aulas sobre o idioma estrangeiro, mas assuntos diversos lecionados em um outro idioma além do português. "Só assim em nível subconsciente que o aluno vai poder se tornar fluente um dia", finaliza.

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